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Voltar17/06/2022
Há momentos na vida que são chamados divisores de
água. São os famosos momentos em que dividimos a nossa vida em antes dele e
depois dele. A descoberta, muitas vezes dolorosa, de que o Papai Noel não
existe é um desses momentos. Mas imagine se o bom velhinho existisse. Fico
imaginando ele tendo que vir ao nosso querido país metido naquelas roupas de
inverno. Pobre homem, suando em bicas em cidades que, mesmo à noite, a
temperatura ultrapassa fácil os 30 graus. Isso que nem falei da barba, que
ajuda ainda mais a transformar a operação toda em um martírio terrível. E as
renas! Pobres renas, criaturas oriundas de temperaturas baixas sendo submetidas
a condições saáricas. Felizmente para o Papai Noel e para os pobres bichinhos
nada disso é verdade. Ficamos chocados ao descobrir que os presentes vêm de outros
“papais”. Um choque que perdura por um bom tempo e muda a nossa visão de mundo.
Outro desses momentos acontece quando descobrimos que
o coelho da Páscoa também é uma história muito mal contada. Crianças não
trabalham com a lógica, portanto nunca se perguntam “mas o que tem os coelhos a
ver com ovos?”. Coelhos são mamíferos, não põem ovos como as aves e os
répteis. Muito menos ovos de chocolate. Coelhos são animais até agressivos, às
vezes, e mesmo que fossem convocados para carregarem os ninhos de páscoa pra lá
e pra cá, duvido muito que fariam isso de bom grado. Mas para uma criança isso
nunca importou. Isso era o de menos, até o momento crucial em que alguém bate
com a língua nos dentes e está tudo acabado. O mundo ficou menos mágico e mais
chato.
Mas momentos como esses não se resumem à nossa
infância. Ainda hoje a nossa visão de mundo pode ser chacoalhada de uma maneira
insofismável. E é isso o que está prestes a acontecer com vocês no momento em
que decidirem seguir com a leitura. Como sabemos todos, estamos na época de São João. Tempo de canjica, de bolo de milho, de curau, de pipoca, de pinhão, de
paçoca e de pé de moleque (sim, somos uma plataforma que pensa com o estômago e
com as papilas gustativas). E é nesse último quitute, o pé de moleque, que
reside o surpreendente e o inesperado. O próximo parágrafo vai transportar
você, caro leitor, para aquele momento de descobertas não tão agradáveis da sua
infância. O próximo parágrafo vai dividir este São João de todos os outros
anteriores. Siga por sua conta e risco.
Já se perguntaram de onde veio o nome pé de moleque?
Olhando bem para a iguaria que une rapadura ao amendoim, a última coisa que ela
nos lembra é um pé. Quanto mais o pé de uma criança. Então, por que cargas
d'água chamamos a iguaria junina por esse nome? Pois a resposta é simples: um
engano sonoro. Um nome que foi se modificando com o tempo via tradição oral.
Conta a história que baianas inventaram o quitute e toda vez que o colocavam
para esfriar, a criançada, apaixonada pelo doce, mas que não o podia comprar
por pura falta de poder aquisitivo, chegava sorrateira, passava a mão em alguns
ainda mornos e saia correndo para se lambuzar mais adiante. Ora, você pode
pensar, os moleques pegavam os doces e davam no pé, daí o nome. Ledo engano! O
nome verdadeiro não é baseado no substantivo pé, mas em um verbo. De tanto
verem a iguaria surrupiada pelas crianças, as baianas, generosas, reservavam
algumas unidades para dar de graça à garotada e repetiam aos gritos para os
pequenos em disparada: “pede, moleque!”.
Essa é a mais pura verdade. Ela vai mudar o seu São
João daqui pra frente? Não. Vai mudar o sabor do “pé de moleque”? Não. Na
verdade, é uma história tão gostosa de se contar quanto é a iguaria de se
comer. E se é gostosa, a Tarimba na Cozinha tá dentro. Sempre.
Sobre
o autor: Fábio Victória é publicitário e cronista.
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Imagem de capa: Esta Foto de Autor Desconhecido está licenciado em CC BY-NC-ND
Em
tempo: Agradecemos ao nosso querido Tarimbado, César Victória da
Silva, pelas contribuições a esse artigo.