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Voltar30/12/2022
Se me
permitem, vou me atrever a usar esse espaço para publicar um texto que é muito
mais sobre história do que culinária, o nosso foco principal. Mas acho que a
data e o tema assim o pedem. Além do que, a profusão de curiosidades
informativas que esse tema suscita é tanta, que eu não poderia deixar de registrá-las.
Espero que
gostem!
O nome dado
à celebração da virada de ano, o termo Réveillon, deriva do verbo réveiller,
que em francês significa despertar. Nesse caso, o despertar de um novo ano.
Sempre que falo
em réveillon e réveiller, me lembro do famoso “Le lever du Roi”, a cerimônia de
despertar diária do Rei Luis XIV, o Rei Sol (esse merecedor de vários textos
sobre culinária aqui no blog, dado o seu apreço às festas e comilanças), pois durante
muito tempo achei que o nome do evento fosse “Le réveille do Roi”. Só
recentemente descobri que o nome correto da cerimônia era “Le lever du Roi”.
Meu Deus! Para quantos passei a informação errada? (Risos).
Erros e confusões
à parte, me acompanhem, pois verão mais coincidências entre o rei que se denominava
Sol e o que vamos falar mais adiante.
Continuando...
Já se perguntou
por que comemoramos a virada do ano entre os meses de dezembro e janeiro?
Por que não comemorar
o início do ano entre março e abril, ou junho e julho, por exemplo?
Afinal, a terra não tem um ponto de partida específico na sua jornada ao redor da sol.
Quem
estabeleceu isso?
Bem, o
culpado disso ser assim, se é que podemos dizer que ele é um culpado, foi outro
grande Rei, ou melhor, o grande General, Governador, Imperador...(sei lá!), o
Romano Júlio César (Caius Iulius Caesar), nascido em 13 de julho (spoiler: a
semelhança do nome desse mês e o nome do imperador não é coincidência) do ano 100
a.C. e morto em 15 de março do ano 44 a.C., num dos acontecimentos mais
conhecidos da história antiga, o seu assassinato numa sessão do Senado Romano,
apunhalado pelas costas por seu “amigo” Bruto, ou Brutus, como costumamos
dizer. Quanto a isso há controvérsias. Na verdade, não teria sido só Brutus,
mas todos os Senadores da fatídica sessão. Aliás, nem todos, pois havia cerca
de 60 Senadores naquela sessão e o corpo de César apresentou “apenas” 23
perfurações.
Quer outra
informação curiosa?
César jamais teria dito a frase “Até tu Brutus? (Et tu Brute? na tradução
correta: És tu Bruto?).
Segundo o historiador Plutarco, se César falou mesmo algo enquanto seu assassinato se consumava, teria pronunciado em grego e não em latim, e teria sido: "Casca, seu vilão, o que você está fazendo?". Casca teria sido o primeiro Senador a tentar apunhalar César que, como um guerreiro habilidoso, se desvencilhou de seu oponente, mas caído ao chão e com a visão prejudicada pelo sangramento de ferimento na cabeça ocorrido na queda da esquiva, foi presa fácil para seus conspiradores.
A frase “Até tu Brutus?” foi imortalizada muitos séculos mais tarde por Shakespeare, em sua peça Júlio César. A frase já era conhecida popularmente na época, mas foi a peça que eternizou a confusão. Afinal, a história é quase sempre mais romântica que a realidade, não?
Bem, fato é
que, tirano ou não, César, como ficou mais conhecido o Imperador, nome que
aliás virou sinônimo da posição (Caesar = Ksar = Kaiser, entendeu?) foi um
Governador que promoveu enormes avanços no campo da vida cotidiana romana, avanços
esses que permanecem até hoje na vida de boa parte da nossa civilização
ocidental.
Foi César,
por exemplo, quem adaptou o calendário solar, usado pelos egípcios há mais de
6.000 anos, e criou o famoso calendário Juliano (nome criativo, não?), que mais
tarde, com apenas um pequeno ajuste, se tornou o calendário Gregoriano (nome
dado em homenagem ao seu “criador” o Papa Gregório XIII, 1502-1585), e que é o nosso modelo de calendário atual.
Aliás, façamos
aqui justiça, vamos “dar a César só o que for de César”: quem fez a adaptação
do calendário solar dos egípcios foi, segundo o historiador Plínio, o sábio e
astrônomo Sosígenes de Alexandria. Júlio César teria sido, na verdade, estimulado
pelo sábio a adotar o novo modelo de calendário, de forma a acabar de vez com as
complicações e confusões que o calendário lunissolar de Rômulo gerava na vida
dos romanos da época.
Quando Júlio
César promulgou o “seu” novo calendário os romanos passaram a adotar o padrão
anual de 365 dias e 6 horas de duração, ou seja, ajustavam-se de fato ao ciclo
solar.
O calendário
Juliano definiu um ano de 365 dias, passou a adotar por padrão 12 meses (3 a
mais que o calendário anterior) e criou o dia adicional a cada 4 anos, chamado
dia bissexto, no ano bissexto (“bi”, de duas vezes, e sexto, de número 6, porque
o número aparece duas vezes no total de dias do ano bissexto, ou seja, 366 dias).
O grande
ganho do calendário Juliano foi o alinhamento da cronologia das datas com os
fenômenos naturais das trocas das estações e as marcações solares (solstícios e
equinócios), tão importantes para a definição da agricultura e outras
atividades de caráter prático. Antes, quando usavam o calendário antigo, isso só
era possível a partir da inserção de meses adicionais, os chamados meses
intercalares, uma operação complicada de entender e que normalmente demandava
ajustes de tempos em tempos.
Enfim, fato
é que foi uma mudança que facilitou demais a vida dos romanos e que nem
poderíamos nos imaginar sem ela hoje.
Essa mudança
foi oficialmente implantada por Júlio César ao final do ano de 46 a.C. O ano em
curso recebeu dois meses adicionais (Unodecembris e Duodecembris), ficando
assim com 443 dias, de forma a ajustar o início da contagem do novo ano solar,
no caso o ano de 45 a.C. (ano 709 para os romanos), no dia das calendas (como
os romanos chamavam o primeiro dia de um mês) de janeiro, o nosso 1º de
janeiro, oito dias depois do solstício de inverno (no hemisfério norte). Posteriormente
o início do ano foi alterado para onze dias após o solstício.
Eis que era
criado assim o nosso dia do Réveillon.
Nesse
momento, acho importante lembrar que a comemoração do Réveillon só se aplica
aos povos que adotam o calendário solar, o que não é literalmente todo mundo,
visto que em algumas culturas ainda se usam calendários lunares, onde os meses
são definidos pelas fases da lua. O calendário islâmico, também chamado de
calendário muçulmano, ou hegírico (Hégira foi o nome dado à fuga de Maomé de
Meca para Medina, ocorrida em 16/07/622 d.C.) é um bom exemplo disso. Nele há também
12 meses, mas cada um com 29 ou 30 dias, e o ano tem 354 ou 355 dias, ou seja, em
média 11 a menos que o nosso. No calendário lunar islâmico os meses começam
quando a primeira porção de lua crescente fica visível após o pôr do sol.
Dada a
diferença do número de dias do ano no calendário muçulmano e o nosso, os meses
islâmicos retrocedem a cada ano que passa em nosso calendário, fazendo com que,
por exemplo, as datas importantes e os feriados muçulmanos ocorram em estações
diferentes e em datas diferentes, segundo os nossos padrões.
Nosso
Réveillon não é uma unanimidade!
Chineses
comemoram seu ano novo em fevereiro e os Judeus em setembro.
Enfim, tudo
não passa de convenção, costume e crença.
Pra
finalizar, achei interessante dar a conhecer a razão dos nomes dos meses do
nosso calendário. Aí vai:
Janeiro
O nome foi uma
homenagem a Jano, deus do Começo na mitologia romana. Jano tinha duas faces:
uma olhando para trás, para o passado, e outra olhando para a frente, para o
futuro.
Fevereiro
O nome foi inspirado
em Fébruo, o deus da Morte e da Purificação na mitologia etrusca. O motivo? Talvez
por ser o último mês do antigo calendário de Rômulo.
Março
O nome
surgiu na Roma Antiga em homenagem a Marte, o deus romano da Guerra. Março é o mês
de início da primavera no hemisfério norte e, por essa razão, o escolhido para
iniciar o ano do calendário antigo dos romanos, assim como também a sua temporada
das campanhas militares.
Abril
O seu nome vem
do latim, Aprilis, que significa abrir, numa referência à germinação das
culturas, dado que esse mês ocorre em plena primavera.
Maio
Do latim
Maius, o mês recebeu esse nome em homenagem à deusa grega Maya, identificada na
mitologia romana como a deusa da Fertilidade Bona Dea, cujos festivais os romanos
celebravam neste mês.
Junho
O seu nome é
derivado da deusa romana Juno, também conhecida como rainha dos deuses, mulher de
Júpiter, o equivalente a Zeus, o deus dos deuses na mitologia grega.
Julho
Conforme já
adiantado, o nome desse mês é uma homenagem a Júlio César, por ter sido o mês
do seu nascimento. Antes o mês era chamado Quintilis, visto que era o quinto
mês do calendário romano antigo.
Agosto
Seu nome se
deu por decreto em honra ao imperador César Augusto. Anteriormente, agosto era
denominado Sextilis ou Sextil, o sexto mês no calendário romano antigo.
Setembro
Seu nome se
deve ao fato de que era o sétimo mês do calendário romano antigo. Deriva de septem,
sete, em latim.
Outubro
Seu nome se
deve ao fato de que era o oitavo mês do calendário romano antigo. Deriva de octo,
oito, em latim.
Novembro
Seu nome se
deve ao fato de que era o nono mês do calendário romano antigo. Deriva de novem,
nove, em latim.
Dezembro
Seu nome se
deve ao fato de que era o décimo mês do calendário romano antigo. Deriva de decem,
dez, em latim.
Mais algumas
curiosidades.
O termo
Calendário tem a ver com a denominação romana para os primeiros dias dos meses,
as calendas. Por outro lado, a tradução latina do termo calendarium
significa “livro de registro”.
O Imperador
César Augusto tirou um dia do mês de fevereiro, que originalmente, no
lançamento do calendário Juliano, tinha 29 e 30 dias, e transferiu-o para o mês
de agosto, o seu mês de homenagem, para que esse ficasse com o mesmo número de
dias de julho, o mês de homenagem ao Imperador Júlio César. Vejam só: as
eternas questões de ego!
Por fim,
caro leitor, se você chegou até aqui, quero então lhe desejar uma ótima virada
de ano, que, tenho certeza, a essa altura tem um significado diferente para
você.
Um ótimo
Réveillon!!!
Em tempo:
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Sobre o
autor: André Victória da Silva é Sócio Fundador e Head de Estratégia e Inovação
da Culinar, a criadora e proprietária da Tarimba na Cozinha.
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Imagem de
capa: Show de fogos de artifício no Réveillon do Rio de Janeiro. Foto de
Autor Desconhecido está licenciado em CC BY-ND